Diversidade e inclusão: quem cuida de quem cuida?
- Gisele dos Anjos

- 30 de jul.
- 3 min de leitura
O sofrimento invisível de quem lidera iniciativas que todo mundo aplaude, mas poucos sustentam
Falar de diversidade nas empresas virou tendência. Tem evento, selo, campanha. Tem discurso bonito no LinkedIn. Mas quem trabalha de verdade com inclusão sabe que, na prática, o caminho é bem menos glamouroso. E muito mais solitário.
Porque não basta querer diversidade no papel. É preciso confrontar estruturas, ouvir o que incomoda, lidar com resistências sutis e explícitas. Quem lidera essas iniciativas carrega, muitas vezes, a dupla jornada emocional de ser parte do grupo minorizado e também a ponte para transformações que quase ninguém quer bancar por inteiro.
Já ouvi relatos demais de pessoas negras que precisaram justificar o próprio lugar antes de sugerir qualquer mudança. De pessoas LGBTQIA+ que viraram “a voz da causa” sem nunca terem sido preparadas para isso. De mulheres que precisaram mediar o machismo com paciência estratégica, enquanto viam suas pautas sendo tratadas como “sensíveis demais”.
Essas pessoas adoecem. E adoecem caladas. Porque carregar a bandeira vem com uma expectativa implícita de força, de resiliência, de ser exemplo o tempo todo. Mas por dentro, há exaustão. E nem sempre dá para compartilhar.
A psicologia organizacional já aponta que quem atua em projetos de diversidade costuma enfrentar mais conflitos éticos, sobrecarga emocional e ambivalência de pertencimento. Isso porque estão sempre no meio do fogo cruzado: precisam traduzir dores estruturais em metas corporativas, enquanto tentam preservar a própria saúde mental.
Na neurociência, já sabemos que contextos de ameaça simbólica, como microagressões ou silêncios constantes, ativam circuitos cerebrais semelhantes aos de dor física. O corpo interpreta exclusão como perigo. E responde com estresse crônico, fadiga e desconexão. O risco? Burnout relacional. Aquele que não é só cansaço, mas sensação de que, apesar de todo o esforço, nada muda de verdade.
Há também o impacto da dissonância emocional: o profissional que precisa manter uma postura estratégica, educada, inspiradora, mesmo quando está profundamente ferido por dentro. Isso cobra um preço. E não deveria ser tratado como parte do “job description”.
O que pode ajudar quem está à frente de iniciativas de D&I sem se perder no processo
Crie redes de apoio horizontais. Compartilhar com pessoas que vivem dores parecidas ajuda a sair do isolamento emocional.
Negocie limites com clareza. Você não é responsável por educar toda a empresa. A missão é coletiva, não pessoal.
Priorize espaços de supervisão emocional. Ter onde elaborar os impactos do trabalho é condição para seguir inteiro.
Faça pausas reais. Lutar por justiça não deve custar sua saúde. Você não precisa se sacrificar para ser legítimo.
Estude liderança inclusiva como prática relacional. Goleman já mostrou que a empatia é uma competência. E ela começa com a capacidade de se escutar.
Não romantize o ativismo corporativo. Há beleza, mas também há dor. Validar isso é um ato de coragem.
Empresas que dizem valorizar diversidade precisam investir em estrutura emocional para quem lidera essas frentes. Isso inclui supervisão, autonomia real, suporte institucional e reconhecimento legítimo do trabalho feito. Sem isso, é só maquiagem ética.
Cuidar de quem cuida não é gentileza. É responsabilidade. Porque nenhuma transformação se sustenta com corpos adoecidos nos bastidores. E nenhuma empresa se torna, de fato, inclusiva enquanto silencia o sofrimento de quem tenta fazer diferente todos os dias.
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